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MP vê problemas em locação de viatura em Valinhos

Promotor aponta “fortes indícios de superfaturamento” e improbidade administrativa na locação de viatura para a Guarda Civil Municipal

Por Bruno Marques

Em ação expedida no último dia 8 de março, o Ministério Público do Estado de São Paulo (MP) apontou que a prefeita Lucimara Godoy (PSD) e o ex-secretário de segurança, Osmir Cruz, cometeram improbidade administrativa e superfaturamento na locação de uma viatura para a Guarda Civil Municipal de Valinhos. A empresa beneficiada no processo, a Luiz Viana Transportes LTDA, de Belo Horizonte (MG), também foi acusada pelos mesmos crimes pelo promotor Tatsuo Tsukamoto.

Histórico

O documento do MP relata que em agosto de 2022, o próprio recebeu uma denúncia anônima, noticiando que a Prefeitura Municipal de Valinhos alugou uma viatura para a Guarda Civil Municipal com superfaturamento, havendo a prática de atos de improbidade administrativa que causaram danos ao erário municipal.

Trata-se da contratação da locação de uma viatura adaptada para a GCM, zero km., pelo prazo de 12 meses, sendo o custo mensal de R$ 29.461 e anual de R$ 353.540.

Justificativa?

Segundo o promotor, não constou na Requisição de Serviços nº 123/2.022, datada de 18/02/2.022, e em nenhum documento anexo, um estudo detalhado dos motivos pelos quais a locação seria a melhor opção do que a compra, nem a indicação de quantas viaturas a Guarda Civil Municipal possuía, quantos guardas municipais estão em atividade e a exposição da efetiva necessidade da locação ou mesmo da compra.

Pelo documento expedido, “de forma ilegal e irregular, constou no termo de referência do pregão e no instrumento do Contrato nº 88/2.022, que os valores orçados como preço de locação seriam, na verdade, devidos em favor da contratada para remunerar não só a locação, mas também outros serviços adicionais, tais como manutenção e seguro da viatura. A ausência de discriminação e de orçamentos específicos para os serviços adicionais foi um artifício fraudulento utilizado pelos requeridos, em conluio, para conferir aparência de legalidade a um preço superfaturado, dificultar ou obstaculizar a detecção da fraude pelos órgãos de controle e para permitir a destruição do patrimônio público municipal”.

A contratação materializada na Requisição de Serviços nº 123/2022 é datada de 18/02/2022, foi feita pela Secretaria de Segurança Pública e Cidadania, e assinada por Osmir Cruz, que foi secretário da Pasta até o mês passado. O veículo é um Toyota SW4 2.8 TDI SRX 7L 4WD 2.022, Diesel. Segundo a promotoria, tem valor que varia entre R$ 421.773 e R$ 432.238.

O Ministério Público diz que o contrato investigado possui objeto misto (locação + serviços + compra) e somente foi elaborado um orçamento superfaturado do aluguel da locação, sem discriminar o valor dos demais itens, violando a Lei de Licitações e Contratos Administrativos.

Objeto da investigação do Ministério Público: locação de viatura da Guarda custa R$ 29 mil por mês aos cofres públicos

Foto César Fonseca | JTV (Outubro/2022)

Provas fortes de superfaturamento

No documento consta Parecer Técnico do CAEX-MP, elaborado por perita economista, que apresentou “provas fortes de superfaturamento”. A perita elaborou duas pesquisas de preços de maneira distintas: foram pesquisados os valores de locação de veículos, com as mesmas modificações feitas nos veículos locados por Valinhos, na BEC (Bolsa Eletrônica de Compras); e foi pesquisado o valor da locação de veículos 4×4 nos cadernos de preços referenciais de serviços terceirizados publicados pelo governo estadual (CADTERC). Em seguida, elaborou-se uma média de preço de locações de veículos, com as mesmas modificações técnicas feitas no veículo locado pelo município, chegando-se ao resultado de que o preço médio e justo de mercado de locação de viatura é de R$ 12.100,87.

A conclusão pericial foi a de que o preço licitado no contrato investigado foi objeto de superfaturamento. O promotor foi além: “E não é só. A análise minuciosa do Parecer Técnico do CAEX-MP concluiu que não só o preço final do Contrato nº 88/2.022 estava absurdamente superfaturado, mas também todos os orçamentos preliminares coletados para formar o orçamento da Administração Pública. Dito de outra forma, todos os orçamentos apresentados pelas empresas são inidôneos e foram utilizados, de maneira enganosa, para legitimar o desvio de recursos públicos”. E completa: “Em oito meses e meio de locação pelo valor pago por Valinhos, seria possível adquirir um veículo SUV modificado novo. A diferença parece injustificavelmente desproporcional”.

“Plano fraudulento”

Tatsuo afirma, “com absoluta certeza, que o plano fraudulento elaborado por Lucimara Godoy Vilas Boas, em conluio com Osmir Aparecido Cruz, é prorrogar o Contrato nº 88/2.022 pelo prazo máximo de 4 anos e, com isso, causar expressivo prejuízo aos cofres públicos. O prejuízo a ser causado aos cofres públicos em caso de não suspensão imediata do contrato será gigantesco e o valor desviado em favor da empresa Luiz Viana Transportes LTDA. seria suficiente para comprar cinco veículos novos, com modificações no mesmo padrão das exigidas pela Prefeitura de Valinhos”.

Ainda acrescentou o promotor que, “desta forma, restou comprovada a prática do ato de improbidade administrativa que causou danos ao erário por meio do superfaturamento na locação de viatura da Guarda Civil Municipal de Valinhos. Por sua vez, a empresa Luiz Viana Transportes LTDA. é particular que, em conluio, de maneira dolosa e fraudulenta com os agentes públicos, concorreu dolosamente (com intenção) para a prática do ato de improbidade administrativa e foi a beneficiária direta pelo superfaturamento da licitação e do contrato, devendo responder por força da norma prevista no artigo 3º da Lei nº 8.429/1.992,

solidamente demonstrado que se trata de contrato superfaturado e o valor do sobrepreço calculado foi de R$16.899,13 por mês, num total de R$ 202.789,56 por ano. Todavia, o valor total do prejuízo ao erário pode ser maior, dependendo do tempo que o contrato permanecer vigente e não for suspenso”.

“Fraude”

O Ministério Público considerou que cada um dos agentes públicos atuou no procedimento de dispensa de forma dolosa. “Osmir Cruz, então secretário de Segurança foi o responsável por elaborar a justificativa da contratação, materializada na Requisição de Serviços nº 123/2.022, datada de 18/02/2.022. Ainda, de maneira dolosa, instruiu o orçamento prévio da Administração Pública superfaturado, já a partir de orçamentos preliminares com sobrepreço apresentados por empresas”.

Continua o MP: “A requerida Lucimara Godoy, em conluio (cumplicidade), autorizou a abertura do procedimento licitatório. Os agentes públicos requeridos, prefeita e ex-secretário, também foram os responsáveis por apresentar um orçamento genérico apenas do valor da locação de uma viatura, sem realizar uma discriminação e de orçamentos específicos para os serviços adicionais (manutenção, seguro etc.) e das adaptações exigidas pelo município, como um artifício fraudulento para dificultar ou obstaculizar a detecção da fraude pelos órgãos de controle, em violação às regras de discriminação do objeto e de orçamento de todos os bens, produtos e serviços, violando o art. 14 da Lei nº 8.666/1.993, e art. 3º, incs. II e III, da Lei nº 10.520/2.002”.

“Desvio de dinheiro público”

Tatsuo avaliou que, “dentre outras omissões deliberadas, não elaboraram um estudo detalhado dos motivos pelos quais a locação seria a melhor opção do que a compra e venda, nem a indicação de quantas viaturas a Guarda Civil Municipal possuía, quantos guardas municipais estão em atividade e a exposição da efetiva necessidade da locação em vez da compra. Tudo a demonstrar que, desde o início, não buscavam a locação de uma viatura para a GCM, mas sim o desvio de dinheiro público. Num cenário de fraudes generalizadas, Lucimara Godoy chancelou toda a fraude e as decisões de Osmir Cruz e homologou o procedimento licitatório em decisão proferida em 24/06/2.022”.

O promotor afirma que ambos tinham ciência das “diversas infrações e ilegalidades de suas condutas”. E acusa: “não paira nenhuma dúvida de que os atos praticados por Lucimara Godoy e Osmir Cruz foram os responsáveis diretos por causar danos ao erário público municipal. Do mesmo modo, não paira nenhuma dúvida da responsabilidade da empresa Luiz Viana Transportes LTDA., por ter concorrido, dolosamente, para a perpetração da lesão ao erário municipal, sendo a principal beneficiária do dinheiro público desviado, por ter celebrado contrato administrativo superfaturado. Agiram de maneira dolosa, com o claro propósito de causar dano ao patrimônio público e favorecer a empresa contratada”.

O Ministério Público ainda acrescentou um agravante ao caso: “não se está diante de mero dolo de natureza civil, mas um dolo elevado, com muita intensidade e voracidade, digno de um dolo direto de primeiro grau do Direito Penal. Os agentes públicos requeridos possuem formação acadêmica e experiência em seus cargos (ensino superior e o conhecimento prático do atuar da Administração Pública) e tinham plena consciência das ilegalidades, o que é reforçado pela prefeita ser capitã da Polícia Militar”.

Improbidade administrativa

O parágrafo 4º do artigo 37 da Constituição diz que atos de improbidade administrativa importarão a suspensão dos direitos políticos, perda da função pública, a indisponibilidade e ressarcimento ao erário. “Ao agir da forma narrada, os requeridos incorreram na tipificação prevista pelo artigo 10, inciso V, da Lei nº 8.429/1.992, definidor dos atos de improbidade administrativa que causam prejuízo ao erário. Permitir ou facilitar a aquisição, permuta ou locação de bem ou serviço por preço superior ao de mercado. Conforme visto acima, restou comprovado o superfaturamento na locação de viatura para a Guarda Civil Municipal de Valinhos”, relata o documento.

“Exala má-fé pura e elevado nível de desonestidade”

Tatsuo afirmou que a Lei de Improbidade Administrativa não visa punir o agente público inábil ou incompetente, mas sim o desonesto, o corrupto, aquele desprovido de lealdade e boa fé: “e é exatamente desse último tipo de administradores públicos de que cuida esta ação. A conduta dos requeridos exala má-fé pura e foi praticada com mais forte modalidade de dolo, o direto de primeiro grau, e marcada por um elevado nível de desonestidade”.

Suspensão do contrato, devolução da viatura e do dinheiro

Segundo o MP, o contrato administrativo investigado foi objeto de superfaturamento, razão pela qual é requerido a sua nulidade: “ele merece ser decretado nulo. Da nulidade do contrato decorre a obrigação de desconstituição de seus efeitos, principalmente, o ressarcimento dos danos causados ao erário. Requer-se a concessão de medida liminar para decretar a suspensão da vigência e eficácia do Contrato nº 88/2.022, determinando que o município entregue, imediatamente, a viatura alugada para a empresa Luiz Viana Transportes LTDA. em cinco dias, sob pena de responder por crime de desobediência e imponha a proibição de novos pagamentos em favor da contratada, inclusive os pendentes, sob pena de caracterização do crime de peculato-desvio”.

Perda da função e suspensão de direitos políticos até 12 anos

Declara por fim o documento expedido, que a conduta dos requeridos configura ato de improbidade administrativa, nos termos do artigo 10, inciso V, da Lei nº 8.429/1.992. Assim, o Ministério Público solicitou a condenação da prefeita Lucimara Godoy e do ex-secretário Osmir Cruz pela prática de atos de improbidade administrativa.

De acordo com o MP, eles “causaram prejuízo ao erário, por violação ao artigo 10, inciso V, e da Lei nº 8.429/1.992” e pede que lhes sejam impostas “as sanções previstas no artigo 12, inciso II, da referida Lei, a perda dos bens ou valores acrescidos ilicitamente ao patrimônio, à perda da função pública e a suspensão dos direitos políticos até 12 anos”.

Questionamento à Prefeitura

O Jornal Terceira Visão enviou questionamentos, na tarde da última segunda-feira, dia 13, à assessoria de imprensa da Prefeitura que, até o momento desta publicação, não se manifestou.

Demanda sobre Processo Administrativo nº 7.988/2.022

Qual o posicionamento da prefeita sobre a acusação de superfaturamento feita pelo Ministério Público?

Qual a conduta da prefeita a respeito das irregularidades apontadas pela promotoria Contrato nº 88/2.022 (Processo Administrativo nº 7.988/2.022 – Processo de Compras nº 84/2.022 – Pregão Presencial nº 09/2.022)?

Por que o processo licitatório nº 84/2022 não justificou a locação da viatura pelos valores mostrados?

Por que o ex-secretário Osmir Cruz saiu de sua posição de secretário e quando aconteceu a sua saída?

Veja abaixo o documento na íntegra

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