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Estupro no casamento?

Dr. Wilson Vilela é advogado, escritor, autor e professor

O chamado estupro, do latim “stupru”, é um crime que consiste em constranger mulher, de qualquer idade ou condição, a conjunção carnal, por meio de violência ou grave ameaça. Seria o coito forçado, a violação do corpo da mulher, de sua liberdade sexual.

O Código Penal Brasileiro estabelece no seu artigo 213 o delito de estupro assim o definindo: “constranger a mulher à conjunção carnal, mediante violência ou grave ameaça”.  O objetivo desse dispositivo legal é proteger a liberdade sexual da mulher, pois toda pessoa tem o direito de dispor de seu corpo como melhor lhe aprouver, respeitadas, entretanto, certas restrições impostas pela vida em sociedade. E, pela própria natureza, somente o homem pode ser sujeito ativo desse crime, já que somente ele pode manter com a mulher conjunção carnal, que é o coito natural, isto é, a relação sexual.

O estupro, que alguns menos avisados teimam em chamar de “estrupo”, provoca repulsa em qualquer pessoa de caráter mediano e, por essa razão, é considerado crime hediondo nos termos do art. 1º da Lei 8.072, de 25/7/1990, o que o torna impossível de ser objeto de anistia, graça, indulto e liberdade provisória, além de ser inafiançável.

Em sala de aula, que é um laboratório dos mais dinâmicos, um dos alunos me perguntava se seria possível, em nosso país, o marido praticar esse crime contra a sua mulher. Alguns juristas entendem que não há essa possibilidade em função do dever de relacionamento sexual entre os cônjuges, dever esse inseparavelmente ligado ao casamento. Outros, entretanto, entendem que, diante de certas situações haverá crime. Nesse particular, Damásio E. de Jesus, manifesta-se nesse sentido. Para o ilustre criminalista, “seriam, por exemplo, as hipóteses de o marido se encontrar com doença venérea ou por ser portador de moléstia grave ou contagiosa, a mulher estar doente, menstruada, ou período pós-parto (impossibilidade de manter relacionamento sexual, portanto). A mulher também pode negar-se ao ato sexual por razões morais, tais como a situação de saber que o marido teve pouco antes e no mesmo dia, relações sexuais com prostituta ou amante, ou a hipótese de manter relações sexuais no dia da morte do próprio filho. A solução, muita vez, dependerá do caso concreto” (Direito Penal, SP: Ed. Saraiva, vol. III, p. 89).

Pesadas as opiniões contra e a favor, o certo é que, nos dias de hoje, não me parece mais ser possível considerar a mulher como um objeto do homem. Aliás, parece que estamos caminhando para o polo oposto, onde a mulher está considerando o homem como seu objeto. De qualquer forma estamos falando da mulher casada. E nessa situação, a mulher não pode ficar submissa aos caprichos do homem, sob a alegação de que o casamento traz direitos e deveres. Ora, se existem direitos e deveres, estes devem ser suportados e praticados recíproca, proporcional e igualmente, por ambos os cônjuges. A igualdade de direitos deve prevalecer em todas as circunstâncias, inclusive nas relações sexuais. Nada justifica que a exigência de satisfação sexual autorize o uso da força, o emprego da violência física ou moral. Nada existe na legislação civil para obrigar alguém a uma prática desmedida de atos sexuais.

Os atos de violência sexual devem ser impedidos. Aquele que se sentir rejeitado, tanto a mulher como o homem, poderão recorrer à Lei do Divórcio, buscando eventual separação por injúria grave, ou seja, a recusa, de um ao outro, do cumprimento do “debitum conjugale”.

De forma que, para o direito brasileiro, como sustentam Celso Demanto e outros reconhecidos autores, dentre os quais o combatente advogado, o colega João Carlos José Martinelli, não é estranha a possibilidade de ser o marido autor do crime de estupro contra a própria esposa, bastando para isso que se configure o constrangimento ilegal visando à conjunção carnal.   Se eu estiver equivocado, não errado, porque professor não erra, equivoca-se, que me corrija, com a proficiência que lhe é peculiar, o meu preclaro amigo e nobre colega, o doutor em direito penal, Luis de Almeida.

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