Professor reforça a importância do aprendizado de História e Sociologia

Docente identifica problemas de dominação, mas, como virtude de quem leciona, mantém perspectiva otimista

Por Bruno Marques

Bruno Anselmo Coelho desempenha o trabalho de professor de História. Ele tem 23 anos, é morador de Valinhos, e leciona na rede estadual. Em razão do Dia do Historiador, celebrado no último dia 19, o Jornal Terceira Visão o entrevistou para que o docente explanasse a respeito da importância da compreensão dos sujeitos históricos e sociais que somos.

Quais foram as influências ou inspirações que te despertaram a vontade ou necessidade de lecionar História?

Me inspirei nos meus professores e professoras do ensino básico, sobretudo os de Ciências Humanas, uma vez que esses abriram meus horizontes e potencializaram o meu protagonismo durante a formação. A necessidade surgiu tanto pela conjuntura política, de 2013 para cá, quanto por uma questão mercadológica.

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No próximo dia 19 é celebrado o Dia do Historiador. Qual a importância que esta função tem para a sociedade?

Para a sociedade, o(a) Historiador(a) contribui a partir da interpretação de fontes históricas, sejam elas escritas, arqueológicas ou orais, autênticas ou não. Um documento nos revela diversas informações sobre o passado, as sociedades, as culturas, a política e a vida social no qual foi produzido. Além disso, é a partir desses registros que se torna possível a preservação da memória coletiva, a compreensão das nossas origens, a construção de identidades, o desenvolvimento de pensamento crítico e o entendimento do presente, inerente ao tempo histórico.

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Quais os desafios que você vê, e possivelmente enfrenta, como professor de História, em uma época de tanto revisionismo, negacionismo e distorções de fatos históricos? E quais os riscos das práticas citadas?

O negacionismo e o revisionismo levam à desinformação e à distorção da realidade histórica, culminando em uma interpretação incorreta de processos e eventos. São mecanismos usados por alguns grupos políticos para negar ou minimizar fatos em favor de uma agenda ideológica, ou seja, para sustentarem suas narrativas. Enquanto professor, meu papel é voltado para o desenvolvimento de habilidades de reflexão crítica nos estudantes, buscando ensiná-los a discernir entre informações confiáveis e informações enganosas, falsas ou imprecisas.

Como você vê, na média, a educação e o conhecimento do brasileiro sobre História? Que nota você daria?

É difícil ponderar de maneira generalizada sobre o conhecimento histórico de toda uma população. Entretanto, vale lembrar que o ensino de História nas instituições públicas, privadas ou populares utilizam periodizações escolares ou não-monográficas para fins didáticos. A maioria dos brasileiros tem um conhecimento básico sobre os principais eventos da história do Brasil e do Mundo, contudo, apresentam uma enorme dificuldade em compreender processos mais complexos ou menos conhecidos. As desigualdades no acesso à Educação de qualidade, nos recursos, na disponibilidade de materiais, na estrutura, entre outros, impactam diretamente nessa defasagem geral. Eu daria uma nota 6.

A inovação tecnológica, científica e cultural transformarão a sociedade de maneira única

Bruno Anselmo Coelho

Pergunto na média porque há, sabidamente, uma gigantesca desigualdade de acesso à educação entre o privilegiado ensino privado e a escassez e sucateada rede pública. Quais as consequências desta destoante diferença para a História do país e do mundo?

A desigualdade no acesso à Educação pode ter um impacto significativo na construção de conhecimentos históricos. Sabe-se que as escolas públicas enfrentam falta de recursos e de materiais, salas superlotadas, problemas estruturais e uma defasagem no que se refere à qualidade do ensino. O Currículo Paulista e a BNCC, quando reformulados a partir da Reforma do Ensino Médio (em 2017), tornaram o trabalho do professor ainda mais difícil: temos que lidar com um currículo que abandona a estrutura do ensino e foca em uma educação mercadológica, com Itinerários Formativos vagos, materiais mal elaborados e novas disciplinas impraticáveis. Desde esse ano, inclusive, desobriga disciplinas imprescindíveis ao 3º ano do EM como História, Sociologia, Filosofia, Física, Química e Biologia, tornando essenciais somente Português e Matemática, com aulas reduzidas, enquanto que, nas escolas privadas, os currículos acabam sendo mais flexíveis.

Neste mês também é celebrado o Dia da Construção Social. Onde exatamente a História se funde à Sociologia e qual a importância de saber como aspectos da sociedade são construídos através da edificação histórica?

A Sociologia desempenha um papel imprescindível na compreensão da História, uma vez que analisar e elaborar novas inferências sobre instituições, grupos sociais, classes, gêneros, etnias, etc. somente é possível através do conhecimento sociológico. Para entender como as sociedades se moldaram ao longo do tempo, é necessário que a abordagem se volte para a análise das estruturas sociais, das relações de poder, da desconstrução de narrativas dominantes, das mudanças sociais e da construção de relações e processos sociais. Logo, para uma interpretação histórica, necessita-se do estudo das diferenças de classe, raça e gênero, investigando de que maneira essas perpetuaram processos de dominação e exploração e como impactaram nos conflitos entre os diversos sujeitos históricos, principalmente aqueles subalternos ou marginalizados.

“Negacionismo e revisionismo são mecanismos usados por alguns grupos políticos para negar ou minimizar fatos”

Bruno Anselmo Coelho

Por fim, qual sua perspectiva para os próximos anos? A História é mesmo cíclica?

Minha perspectiva é otimista no sentido de que a sociedade tem avançado em vários debates. Há um evidente avanço tecnológico que acelera cada vez mais o fluxo de informações e conhecimentos, novas formas de produzir e pensar que impactam diretamente nossas vidas. Em relação ao Brasil, esse otimismo é ainda mais presente, visto que o cenário atual é de crescimento econômico, redução de desigualdades e investimentos em Pesquisa e Desenvolvimento, Meio Ambiente, Cultura e Educação. É preciso revogar o Novo Ensino Médio, valorizar a carreira docente, reindustrializar o país, promover a Reforma Agrária, combater o racismo, a LGBTfobia, o machismo, entre outras pautas sociais significativas.

A História nos sugere que tendências se repetem ao longo do tempo, contudo, ela é marcada pela complexidade e é constituída de variados períodos, fatos e processos que envolvem diferentes povos e sociedades, sendo, portanto, imprevisível. A aplicação de padrões de ciclicidade é dificultosa nesse sentido e é usada apenas em sala de aula através de analogias para fins pedagógicos. Em resumo, é difícil afirmar que a História é cíclica, tendo em vista que a humanidade está em constante progresso. A inovação tecnológica, científica e cultural transformarão a sociedade de maneira única. Já estamos vivendo em uma nova era, que será desenvolvida a partir das especificidades das abundantes realidades históricas.

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