Em 1969, Gilberto Gil antevia, num rock psicodélico, os paradoxos e dependências do abuso da tecnologia de hoje
Por Bruno Marques
Canção futurista, que anteviu o que para todos hoje é comum, Cérebro Eletrônico abre o terceiro álbum de estúdio o cantor e compositor brasileiro Gilberto Gil, lançado em 1969.
Trata-se de um rock psicodélico – forte característica do movimento tropicalista, com elementos de funk americano e pitadas de jazz. Esses sabores se evidenciam ainda mais ao vivo, quando vem também com várias ‘batucadas’.
Na letra, bastante profética, Gil, que trabalhou na Gessy Lever de São Paulo em meados dos anos 60, aborda – em meio a eletrizantes ondas distorcidas – a relação entre o ser humano e a tecnologia.
Produção e regravação
A produção é de Manoel Barenbein. De 1969 para 1996, a canção ganhou uma regravação de Marisa Monte. A faixa foi gravada em 4 canais, entre abril e maio de 1969, e aconteceu poucos meses depois de Gil e Caetano terem sido presos por subversão pela Ditadura Militar, duas semanas depois de decretado o AI-5.
Com o corpo preso na prisão, sua mente fez a canção
Durante os quase dois meses que foi preso injustamente pelo regime militar, Gil manteve a mente ativa. Mesmo encarcerado, compôs Cérebro Eletrônico, Vitrines e Futurível. Essas duas que também estão no álbum. Um boa-praça do cárcere lhe emprestou um violão.
Depois da gravação, Gil foi obrigado a ir embora do país e, em exílio, não pode ver o lançamento do seu trabalho. “O fato de eu ter sido violentado na base de minha condição existencial – meu corpo – e me ver privado da liberdade da ação e do movimento, do domínio pleno de espaço-tempo, de vontade e de arbítrio, talvez tenha me levado a sonhar com substitutivos e a, inconscientemente, pensar nas extensões mentais e físicas do homem, as suas criações mecânicas, nos comandos tele acionáveis que aumentam sua mobilidade e capacidade de agir e criar. Porque essas são ideias que perpassam as três canções”, explicou.